TJ/SC permite prosseguimento de ação para incluir mãe em registro da filha falecida

Barreira legal e social impediu mãe de registrar a filha na época do nascimento, em 1976.


O Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) reconheceu o direito de uma mãe de buscar na Justiça o reconhecimento da maternidade de sua filha biológica, mesmo após o falecimento da jovem. A decisão, unânime, foi da 2ª Câmara de Direito Civil, que anulou a sentença de 1º grau e determinou o prosseguimento do processo com produção de provas e participação do Ministério Público.

A filha nasceu em 1976 e morreu em 2021, durante a pandemia de Covid-19. Por barreiras sociais e legais da época, a mãe — que era casada com outro homem — não conseguiu registrar a filha como sua. O nome da mãe não consta na certidão de nascimento da jovem, registrada apenas com o nome do pai.

Ao entrar com a ação, a mãe teve seu pedido negado em decisão de primeiro grau, com base no artigo 1.614 do Código Civil, que exige o consentimento do filho maior para o reconhecimento de filiação. Como a filha já havia falecido, o juiz entendeu que não havia interesse processual.

No entanto, o desembargador relator do recurso ressaltou que o reconhecimento da filiação é um direito fundamental garantido pela Constituição de 1988. Para ele, o pedido da mãe não era apenas simbólico. “O reconhecimento da maternidade é necessário para a retificação do registro civil e para o recebimento de uma indenização de seguro de vida”, apontou.

A decisão também considerou julgados do Superior Tribunal de Justiça (STJ), como o Recurso Especial 1.688.470/RJ, relatado pela ministra Nancy Andrighi. O entendimento é de que o reconhecimento da filiação pode ocorrer mesmo após a morte do filho ou da filha, desde que haja boa-fé e provas da relação afetiva.

Análise com perspectiva de gênero

O julgamento levou em conta o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Segundo o relator, a legislação em vigor na década de 1970 impunha limitações marcadas por valores patriarcais, que impediram a mãe de registrar a filha como sua. “Negar o reconhecimento de um filho extraconjugal é violar direitos fundamentais tanto da criança quanto da mãe, que sofre uma dupla violência”, afirmou.

O vínculo afetivo entre mãe e filha foi comprovado por meio de registros de batismo, fotografias e relatos sobre a convivência. O relator citou decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) para reforçar que “o que faz uma família é, sobretudo, o amor, a comunhão e a identidade entre seus membros”.

Para o colegiado, a extinção antecipada da ação impediu a apuração completa dos fatos. Com a nova decisão, o processo será retomado para que as provas sejam produzidas e analisadas. A decisão da 2ª Câmara de Direito Civil do TJSC foi unânime.


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